Povos Mura repudiam decisão judicial que favorece mineração em Autazes (AM)

As principais organizações indígenas do país manifestaram repúdio à decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que abre caminho para a exploração de potássio em área tradicionalmente ocupada pelo povo Mura, no município de Autazes, interior do Amazonas.
O julgamento ocorreu no dia 7 de maio deste ano. A 6ª Turma do TRF1 validou o processo de consulta indígena realizado pela empresa Potássio do Brasil e autorizou o prosseguimento do licenciamento ambiental junto ao IPAAM – o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas –, afastando o IBAMA da condução do caso.
Para entidades como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e a Articulação dos Povos Indígenas do Amazonas (APIAM), a decisão é considerada alarmante. Segundo elas, houve irregularidades graves na consulta realizada com os povos Mura, incluindo exclusão de comunidades diretamente afetadas, como a do Lago do Soares, além de suposta manipulação de atas e tentativas de cooptação de lideranças.
A Organização de Lideranças Indígenas Mura de Careiro da Várzea (OLIMCV), que representa a comunidade do Lago do Soares, afirma que não foi sequer ouvida no processo.
As lideranças indígenas alegam que a decisão desrespeita tratados internacionais e a própria Constituição Brasileira. A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil, e o artigo 231 da Constituição garantem o direito à consulta prévia, livre e informada sempre que obras ou projetos impactem territórios indígenas.
A região onde o projeto será instalado está situada na Terra Indígena Soares, tradicionalmente ocupada pelo povo Mura e em processo de demarcação desde 1997 junto à FUNAI. Pareceres técnicos da própria fundação apontam que há sobreposição direta entre o projeto de mineração e o território indígena.
As organizações também apontam contradições nos votos dos desembargadores. De um lado, os magistrados afirmam que não há terra indígena demarcada na área; de outro, reconhecem que houve consulta a indígenas — o que, segundo os líderes, revela o uso seletivo de argumentos jurídicos para enfraquecer direitos constitucionais.
Outro ponto destacado é que, conforme a Constituição de 1988, a exploração de recursos minerais em terras indígenas só pode ocorrer com autorização do Congresso Nacional — o que não aconteceu neste caso.
Para a APIB, COIAB e APIAM, a decisão do TRF1 pode abrir um precedente perigoso, incentivando outros empreendimentos a ignorar os direitos dos povos originários. Em nota, as entidades alertam:
“Legitimar um processo contaminado por manipulações internas e violações jurídicas é autorizar, de forma velada, o avanço do extrativismo sobre os territórios indígenas em todo o Brasil.”
Seguiremos acompanhando o caso e trazendo novas informações à medida que o processo se desenrola.